Broa mimosa e casa gandaresa: são estes os dois ex-libris da aldeia do Boco, no concelho de Vagos, que assim se distingue no distrito de Aveiro pelo seu património gastronómico e arquitetónico único. A broa em questão combina farinhas de trigo e de milho, é cozida em forno a lenha e apresenta-se num formato redondo de cor castanha e com aroma a canela. Começou por ser alimento regular em todas as casas da terra e agora é procurada também pelos forasteiros, pelo seu estilo de confeção à moda antiga, sempre mais saboroso. Mas é iguaria rara, sujeita a encomenda às poucas senhoras idosas e prendadas que ainda conhecem a receita e os truques da sua confeção. Sem pedido prévio, a mimosa só está disponível na freguesia de Soza por altura das festas de Senhora das Candeias e de Santo Inácio, na Feira Anual da Abóbora e, uma vez por mês, na sede da Confraria dos Sabores da Abóbora.
Já as casas gandaresas, algumas estão a ser transformadas em alojamento local e outras continuam habitadas pelos seus proprietários, pelo que, sem a sorte de um convite privado, alguns visitantes ficarão a conhecer sobretudo a fachada em duas ou três cores deste casario típico, com origens remotas nas habitações árabes ou mouriscas. Modestas e discretas, as gandaresas são tradicionalmente de um único piso térreo e organizam os seus espaços em torno de um pátio traseiro central, tendo começado por ser construídas em adobe, telha caleira e madeira de pinho, mas recorrendo agora aos materiais correntes, mesmo que ocasionalmente mantendo alvenaria de terra crua e cozida. No seu formato de casas-pátio, insuspeito a partir da rua, estas edificações evocam ainda a disposição das moradias romanas rurais, que assim valorizavam o convívio em família e em privacidade.
Essa arquitetura com pátios mostrava-se também mais favorável ao tratamento as colheitas, já que, hoje como antigamente, a aldeia de Boco continua a ter na agricultura uma das suas principais atividades económicas. A fertilidade proporcionada pelo rio Boco favorecia a produção e, numa visita a esta aldeia classificada, isso ficará demonstrado num passeio pelas levadas do Barreto, do Sul e dos Moleiros (que também é conhecida como a do Meio).
Todas essas condutas para encaminhamento da água serviam de força motriz às azenhas da terra, que, atualmente, são 14 e às quais se juntam ainda três moinhos. Desse conjunto, contudo, bem preservadas nos seus edifícios em pedra estão apenas as azenhas da Ti Luísa e da Fonte, que continuam em laboração e integram a lista de pontos de interesse ao longo do Trilho das Levadas das Azenhas do Boco. ■