O Rio Douro cedo fez a reputação dos lugares de Midões e Gondarém, onde se pescava lampreia e sável de tal categoria que já os romanos daí enviavam peixe para a corte do imperador, em plena Roma. Povos anteriores também apreciariam o bom pescado da zona, mas fariam com ele repasto imediato, servido em povoamentos como os sinalizados pelas Mamoas do Monte Grande e por outros sítios arqueológicos de Folgoso e Monte Alto.
Bem próximos um do outro, os lugares de Midões e Gondarém evoluíram desde então a par e par – sempre com vista para o rio a partir de um casario de traça bem tradicional, ainda feito de toscas lâminas de xisto – e é essa convivência que justifica que os dois povoados tenham sido objeto de uma única candidatura à rede de “Aldeias de Portugal”, partilhando assim a mesma classificação.
Pesca e agricultura são ainda hoje atividades com impacto em Midões e Gondarém. As vinhas de castas brancas e tintas dispõem-se por socalcos ao longo do Douro e do Paiva pelo menos desde 1513, data da mais antiga referência ao assunto, no Foral de D. Manuel. Mas a exploração mineira também marcou os dois lugares, onde se preservam vestígios de complexos industriais desativados como as Minas de Terramonte, especializadas em zinco e chumbo, e a Companhia Portuguesa das Minas de Gondarém, que a esses dois minérios acrescentava a prata.
A população dos dois lugares é agora bem mais reduzida, mas, mesmo entre as gerações que migraram, é assíduo o regresso às suas habitações de origem, que mantêm bem cuidadas ou recuperam. O mesmo acontece com o património desses dois lugares da freguesia de Raiva, em especial com a estimada Capela de Santo Ildefonso, que, a meio caminho entre Midões e Gondarém, assinala a união entre as duas comunidades.
Entre ruelas estreitas de empedrado com algum declive, há assim para apreciar janelas de decoração pitoresca, alpendres e jardins decorados por flores, alfaias e cestos, e ainda hortas com canastros, uma estufa comunitária, eiras e lavadouros públicos. Nesse edificado, o Pelourinho da Raiva assinala a passagem do tempo desde a Idade Média e os arcos de cantaria granítica da Casa do Passadiço revelam-se um cenário cinematográfico, que tanto pede cenas românticas como policiais de época.
Mais junto ao rio, a paisagem passa a fazer-se com os tons do Douro, uma pequena e sombreada praia fluvial, um cais flutuante, um baloiço e mesinhas de esplanada. Daí se apreende melhor, numa pausa de apreço por toda a envolvente, quanto Midões e Gondarém se distinguem, de facto, de meios urbanos e citadinos sem verdadeira identidade.
Para reflexões de idêntica profundidade ou precisamente para não se pensar em nada, estes povoados permitem ainda caminhadas pelo denso eucaliptal da zona, aqui e ali pontuado por alguns carvalhos, sobreiros e medronheiros. Mas roteiros mais seguros e definidos são o Percurso Pedeste PayvaPé e o PP10 – Aldeias do Xisto, que inspiram sensações de tranquilidade e geram orgulho alheio na autenticidade deste território típico e de grande beleza natural. ■