Lagaretas e alpondras são as construções raras que mais distinguem Várzea de Calde. As primeiras, escavadas na rocha, provam que a pisa do vinho é prática antiga no povoado e que, por isso mesmo, ele é habitado há milénios; as segundas, pela forma elegante como as rochas foram instaladas no rio para permitir a passagem de uma margem à outra, denunciam como sucessivas populações se adaptaram ao Rio Vouga e às águas frias da Serra da Arada.
Num terraço natural de vista impressionante, Várzea de Calde soube aproveitar a sua localização no município e distrito de Viseu construindo levadas que conduziam as águas até aos campos, edificando moinhos para moer os cereais aí colhidos e rentabilizando o cultivo do linho com o fabrico de têxteis. Da farinha local, a aldeia sempre fez pão; das uvas e azeitonas, continua a fazer vinho e azeite; do linho, ainda costura taleigas, mas guarda sobretudo a memória dos tempos áureos da tecelagem.
Todos esses aspetos da história económica da aldeia se podem conhecer melhor no Museu do Linho de Várzea de Calde, instalado numa genuína casa de lavoura que foi recuperada para agora mostrar objetos como teares de linho em funcionamento real, alfaias usadas na apanha da azeitona e utensílios utilizados na matança do porco – cujas carnes protagonizam os principais pratos da gastronomia local.
Um passeio mais alargado pela povoação permitirá conhecer também a Fonte de São Francisco e a Barragem de Várzea de Calde, símbolo da fertilidade que desde cedo favoreceu o regadio na região e levou a Rainha D. Maria I a acreditar nas sementeiras. O próprio casario da aldeia testemunha longevidade, na forma como algumas habitações preservam fachadas antigas à base de granito de dupla tonalidade, cinzenta e amarelada.
Tradicional em Várzea de Calde é igualmente a Queima do Toco em honra de São Francisco, padroeiro da aldeia. Esse costume repete-se a cada 3 de outubro, véspera do dia dedicado ao santo, e consiste em pôr um grupo de pessoas a puxar um carro de vacas carregado de troncos roubados à floresta por homens solteiros que ainda não tenham ido à inspeção militar. Essa madeira é depois depositada no Largo de São Francisco para alimentar a fogueira comunitária que aquece o respetivo baile, num convívio que faz regressar à terra muitos dos seus emigrantes na Suíça.
Se restarem energias, no dia seguinte elas podem ser aplicadas em dois percursos para cumprir a pé ou de bicicleta: a Rota da Ribeira da Várzea, num circuito de 8,8 quilómetros, e o Caminho Português de Santiago pelo Interior, que, embora envolvendo um total de 205 quilómetros até à meca espanhola da peregrinação católica, pode restringir-se apenas ao distrito de Viseu, o que, mesmo sobre o selim de uma BTT, dará dois dias de paisagem para descobrir. ■