Jueus é uma aldeia onde facilmente se encontram habitantes a trabalhar na lida agrícola e a cuidar dos seus rebanhos. Muitos desses residentes ainda envergam a “capucha”, um traje tradicional em burel que, entretecido de forma especial, tanto os protege do frio como do calor.
Localizado a 850 metros de altitude na freguesia do Guardão, no concelho de Tondela, este povoado tem como enquadramento paisagístico a serra do Caramulo e resguarda-se numa vertente abrupta que, no sopé do Caramulinho, resultou de uma falha tectónica na crosta terrestre.
Em todo o território do distrito de Viseu, Jueus é, de facto, uma das aldeias mais originais e pitorescas, com uma ambiência muito tradicional junto às bacias hidrográficas dos rios Vouga e Mondego. Daí flui a água que abastece a fonte da Grelha, onde os pastores se tornam atração fotográfica com os seus rebanhos e manadas.
Também fotogénicas são as paisagens que se podem apreciar a partir de dois pontos específicos desta localidade classificada como “Aldeia de Portugal”. É o caso do miradouro que, a 1075 metros de altitude, dá a ver as serras da Estrela, do Açôr, da Lousã e do Buçaco, numa perspetiva que se estende pelo Vale dos Besteiros, e do outro que, no Cabeço da Neve, 995 metros acima do mar, desvenda densa vegetação e penedos graníticos, no enquadramento do parque natural Vouga-Caramulo.
Invertendo a sua anterior tendência de envelhecimento com famílias jovens que aumentaram a taxa de natalidade local, Jueus revela atualmente uma nova dinâmica, expressa num renovado interesse pelos saberes e ofícios locais, como o fabrico de pão em fornos a lenha, a silvicultura e a apicultura. Moradores e visitantes partilham ainda o gosto pela culinária confecionada com produtos abundantes como o milho e a batata, cultivados em campos como os que pontuam a Grande Rota do Caramulo e a Rota dos Caleiros – termo que designa os canais construídos em granito para transportar a água desde os pontos mais altos da serra e assim abastecer a povoação
No regresso à aldeia, uma visita ao centro de interpretação instalado na antiga escola primária de Jueus dará a conhecer preciosidades da fauna e flora locais, e também permitirá descobrir as origens da povoação, cujo nome atual os investigadores atribuem à palavra antiga para “judeus”. A comunidade judaica ter-se-á fixado na região por altura da presença romana em solo luso e a aldeia ainda hoje preserva alguns indícios de práticas judaicas medievais, percetíveis em marcas de cruzes desenhadas tanto no estilo dos judeus assumidos quanto no traço criptojudaico dos cristãos-novos, convertidos à força para evitar perseguições pela Inquisição.
Mas o povoado de Jueus já seria habitado bem antes disso, como comprovam os sítios arqueológicos da Mamoa do Cabeço Talada, túmulo de contorno subcircular sobre um filão de quartzo leitoso, e da Mamoa das Laceiras, montículo semicircular com grande quantidade de elementos pétreos em quartzo e granito.
É nesse material rochoso, aliás, que estão construídas as casas mais típicas de Jueus, em arquitetura serrana, pensada para fazer face a invernos rigoroso. O granito predomina igualmente nas ruas e ruelas da aldeia, seja calcetado em cubos ou disposto em grandes lajes. A calçada que liga o povoado aos campos mais a sul terá até origem medieval, testemunhando o esforço de comunicação entre os lugares de Múceres, Panasqueira e Tojosa, e ainda Quinta da Póvoa, Marruge e Pousadas.
O roteiro só fica completo, no entanto, com uma visita à Capela do Menino Jesus, templo católico também em edificado granítico e com vista até à Serra da Estrela, e uma passagem pelo Museu do Caramulo, cuja coleção, a pouca distância da aldeia, integra desde peças do Antigo Egito até obras de Picasso, incluindo ainda mobiliário, cerâmica, tapeçaria, brinquedos e a famosa coleção de automóveis de João de Lacerda (1923-2003) – que fundou esse espaço museológico em 1959 a partir do projeto concebido pelo seu irmãos Abel, falecido precocemente num acidente de viação em 1957, aos 36 anos de idade. ■